LAS CONFERENCIAS TEMÁTICAS: Crises ambientais e crisis globais
 

 

Nosso tema nos remete a pensarmos o momento que vivemos, do ponto de vista das crises ambientais, e também o grau de conflito e articulação entre o lado da integração, criada, basicamente pelo avanço dos meios de comunicação, entre povos e regiões do planeta, e o aprofundamento de diferenças de acesso às riquezas, que existe tanto dentro dos países como entre países.

As atuais crises globais são absolutamente distintas das que conhecemos no passado. Até o início do século XX, as crises ambientais tinham um caráter mais regional. Não que não existissem, pois elas são fruto do crescimento, da atividade humana. Hoje, no entanto, produzimos impasses na natureza em escala planetária. Um dos grandes problemas atuais, as mudanças climáticas e o aquecimento global, é o tipo da coisa que é empurrada, um tipo de modelo de desenvolvimento, de industrialização, de organização de cidades, um modelo de vida irracional. Atualmente, um único país, os Estados Unidos, é responsável por ¼ da emissão desses gases que provocam o aquecimento em todo o planeta. A continuar o ritmo de crescimento de consumo de combustíveis fósseis, logo a liderança pode ficar com algum outro país, mais provavelmente na Ásia, mas essa é uma crise, um problema que está sendo colocado para o meio ambiente. E isso se repete com os oceanos, as florestas, a poluição química.

Do lado ambiental, temos crises em escala planetária, do lado das diferenças, temos um quadro não menos dramático: o não acesso, por parte de enormes contingentes da população, aos benefícios básicos do que pode ser considerada uma vida moderna. Um terço da população do mundo não tem acesso a uma água de qualidade razoável. Se colocarmos lado a lado as questões ambientais e a diferença de acesso aos benefícios e ao que se pode chamar de riqueza, fica claro que não é possível fornecer aos 6 bilhões de habitantes do planeta o mesmo nível de "benefícios" das populações mais ricas. Um norte-americano, por exemplo, consome, em média, 16 vezes mais energia que um brasileiro. Traduzindo isso em números, chegamos à conclusão de que não é possível oferecer o que se pode chamar "benefício", nos países mais ricos, a todos no planeta. O que isso revela? Revela que há algo errado com o que se chama de "benefício", algo profundamente errado com o que deve ser o mundo desejado pelas gerações presentes e futuras, principalmente entre as camadas em que esses "benefícios" são escassos.

O que se coloca para nós, tanto ambientalistas como pessoas que militam em outras áreas, é a necessidade de discutir o que poderia ser um modelo para o futuro. Primeira questão: garantir o caráter público dos bens comuns à humanidade, assim como o controle social sobre o meio ambiente. Isto implica em rever os padrões de acesso aos recursos da natureza, pois esses recursos são consumidos quando se produz algum benefício à humanidade, na forma de energia, água ou bens de serviços. O acesso a esses benefícios deve ser democratizado e universalizado. Não acredito que exista uma resposta pronta a isso, mas as dificuldades e impasses já são vividos nos dias de hoje. Aqui mesmo, no Rio Grande do Sul, temos uma polêmica, uma disputa, uma briga com relação ao uso ou não uso de organismos geneticamente modificados. A ação do MST foi reveladora de um conflito que existe dentro da sociedade e que é interessante, pois envolve não só gaúchos, ou brasileiros, como uma empresa transacional que tem neste Estado, como em outros Estados do Brasil, plantações experimentais com organismos geneticamente modificados.

Se aprofundarmos a discussão sobre os transgênicos, iremos perceber que há um problema com a transgenia, com isso de pegar genes e misturar para produzir plantas que produzem veneno e são resistentes ao veneno. No entanto, além desse efeito, há alguma coisa que não diz respeito diretamente a transgenia, mas é uma ameaça à segurança alimentar. Além das técnicas de transgenia, essas empresas monopolizam as sementes dos principais grãos pelo mundo (soja, milho, e mais recentemente arroz). Mesmo no Brasil, onde a tradição é o controle ser feito pelo Estado, temos ido, progressivamente, para as mãos das transnacionais. E isso coloca uma questão interessante: há dez anos, ambientalistas e grupos de consumidores têm brigado contra os transgênicos. No entanto, a oligopolização das sementes pelo mundo permaneceu intocada, apesar da gravidade e importância que merece. Se a transgenia é uma coisa absolutamente nova e aterradora, isso é conseqüência de as principais culturas para a alimentação humana estarem na mão de meia dúzia de empresas. Além de colocar em risco a segurança alimentar, o efeito disso será, é claro, o empobrecimento do campo e das cidades. A oligopolização trabalha no sentido de diminuir a diversidade biológica e empobrecer todo mundo. O caso dos transgênicos é bastante interessante porque provoca uma discussão entre diferentes segmentos, diferentes setores do movimento popular e as diferentes sociedades civis, e revela pontos cruciais, a serem enfrentados de imediato para que algum futuro seja possível.


Roberto Kishinami
Greenpeace (Brasil)
Reprodução editada da gravação da palestra proferida, sem revisão final do expositor.

 




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